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6 de novembro de 2023

O Superior Tribunal de Justiça e a nova definição acerca da responsabilidade civil ambiental “propter rem”

Em meados do mês de agosto de 2023, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), determinou a afetação dos Recursos Especiais 1.962.089 e 1.953.359, para que fossem julgados sob o rito dos recursos repetitivos, sob a relatoria da Ministra Assusete Magalhães.

Como houve determinação de afetação, todos os processos, individuais ou coletivos, que versavam sobre a matéria, onde tenha havido interposição de recurso especial ou de agravo em recurso especial, em tramitação na segunda instancia ou no STJ, foram suspensos.Tal questão foi cadastrada sob o Tema 1.204, tendo como escopo definir se “as obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores ou, ainda, dos sucessores, à escolha do credor”.

No mês de outubro do corrente ano, o recurso repetitivo, Tema 1.204, foi julgado pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, tendo esse definido que “as obrigações ambientais têm natureza propter rem, de modo que o credor pode escolher se as exige do proprietário ou possuidor atual, de qualquer dos anteriores ou de ambos, ficando isento de responsabilidade o alienante cujo direito real tenha cessado antes da causação do dano, desde que para ele não tenha concorrido, direta ou indiretamente”.

O que significa esse julgamento do STJ e quais reflexos práticos ele pode trazer? Essas questões serão respondidas nos parágrafos vindouros.

Primeiro, precisamos entender o que é uma obrigação propter rem. Pois bem, as obrigações de natureza propter rem são aquelas inerentes à coisa, inerentes ao imóvel, obrigações de direito real que acompanham o bem por todo o sempre. Um exemplo prático é a compra de um apartamento com débitos de taxa condominial, onde o comprador do apartamento é responsável pelo pagamento do débito, podendo buscar reaver esse débito do antigo dono, então vendedor.

Mesmo raciocínio se aplica às obrigações ambientais, com várias discussões existentes nos Tribunais Pátrios nesse sentido, todas capitaneadas pelo teor da Súmula 623 do STJ, existindo confusão sobre qual o limite das responsabilidades do vendedor e do comprador do imóvel. Pode o vendedor ser responsabilizado por danos ambientais ocorridos após a venda? Pode o comprador ser responsabilizado por danos ambientais ocorridos antes da compra?
Pois bem, convém apontarmos que essa afetação do tema pelo STJ surgiu por uma necessidade de esclarecimento acerca da extensão da interpretação a ser dada ao teor da mencionada Súmula 623 que já regulamentava o assunto, assim ementada:

“As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor.”¹

Após o julgamento do Tema 1.204 pelo STJ, fixou-se entendimento de que “as obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor ficando isento de responsabilidade o alienante cujo direito real tenha cessado antes da causação do dano, desde que para ele não tenha concorrido, direta ou indiretamente” (essa parte final foi acrescida pelo STJ no julgamento do Tema 1.204).

Ou seja, agora, pós julgamento do Tema 1.204, resta claro que o alienante/vendedor do bem imóvel, pode sim ser responsabilizado por danos ambientais ocorridos posteriormente à venda dele, podendo ter sua responsabilidade afastada se comprovar que o dano ocorreu quando já havia vendido o imóvel e que ele não concorreu, direta ou indiretamente, para a causação do dano ambiental, afastando assim o nexo de causalidade (obrigatório nessa hipótese).

Da mesma forma, o comprador, atual proprietário, também pode vir a ser responsabilizado por danos ambientais ocorridos quando ele ainda não era dono do imóvel. O fundamento dessa responsabilização é que, como se manteve inerte ao dano ambiental ocorrido anteriormente à compra do imóvel, se beneficiou do mesmo e, de acordo com a jurisprudência e da legislação de regência, quem se beneficia da degradação ambiental alheira, a agrava ou lhe dá continuidade não é menos degradador.²

Com essa adequação do entendimento esposado na Súmula 623, o Superior Tribunal de Justiça cravou seu entendimento de que a responsabilização civil por danos ambientais é propter rem (inerente ao imóvel), objetiva (independentemente de ter sido comprovada a culpa) e solidária (podendo ser acionado o antigo ou o novo proprietário, à escolha do demandante).

Os reflexos práticos que o julgamento do Tema 1.204 pelo STJ traz ao ordenamento jurídico pátrio é no sentido de que os compradores e vendedores de imóveis devem redobrar as atenções, principalmente os compradores, analisando os pormenores da propriedade e verificando a existência de danos ambientais, pois, em qualquer momento, podem vir a ser responsabilizados pelos mesmos.

Por fim, vemos o quão importante é a realização de uma diligência integral sobre o imóvel que se pretende comprar, a ser feita por advogados especializados. Apenas assim é possível dar garantia de segurança ao comprador e vendedor, afastando “surpresas” indesejadas no futuro, com responsabilizações por danos ambientais que sequer sabiam que havia ocorrido.

²https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2023/10102023-Repetitivo-estabelece-que-comprador-de-area-degradada-tambem-responde-pelo-dano-ambiental.aspx#:~:text=%E2%80%8BEm%20julgamento%20de%20recurso,de%20ambos%2C%20%22ficando%20isento%20de