NOTÍCIAS
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decide sobre Cobertura Ilimitada para Terapias de Beneficiários com Síndrome de Down: Reflexo da Proteção Constitucional e a Função Social dos Contratos
Por: Artur Francisco Barbosa e Guilherme Felipe Pereira
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou um entendimento essencial para a saúde e dignidade dos beneficiários com Síndrome de Down ao decidir que as operadoras de planos de saúde devem fornecer cobertura ilimitada para terapias prescritas. Esta jurisprudência impede a imposição de limites no número de sessões de terapias essenciais, como fonoaudiologia, terapia ocupacional e psicologia, uma prática que o Tribunal considera abusiva e contrária aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do direito à saúde.
A fundamentação legal dessa decisão se apoia, primeiramente, na Lei nº 9.656/1998, que regula os planos de saúde no Brasil. Em seu artigo 10, a lei proíbe a limitação de dias de internação e de sessões de tratamentos essenciais, assegurando o direito dos beneficiários a cuidados contínuos e indispensáveis. Ainda que a legislação e o rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) não mencionem explicitamente a Síndrome de Down, o Superior Tribunal de Justiça tem interpretado que essa condição exige cobertura integral para garantir um tratamento multidisciplinar, fundamental para o desenvolvimento do beneficiário.
Do ponto de vista jurídico, o STJ sustenta que impor restrições quantitativas às sessões de terapia viola tanto o princípio da função social do contrato, quanto o da boa-fé objetiva, ambos previstos no Código Civil, nos artigos 421 e 422, respectivamente. A aplicação desses princípios é ainda reforçada pelas disposições do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que reconhece a vulnerabilidade do consumidor em relações contratuais de saúde e proíbe práticas consideradas abusivas (art. 4º, I, e art. 51 do CDC).
Além da legislação infraconstitucional, a decisão do STJ também se ancora em princípios constitucionais, principalmente no artigo 196 da Constituição Federal, que consagra a saúde como um direito de todos e um dever do Estado. Na interpretação do Tribunal, ao assumirem a obrigação de fornecer cuidados de saúde, as operadoras de planos de saúde vinculam-se ao compromisso de assegurar o tratamento prescrito, sem que restrições contratuais comprometam a integridade desse atendimento. O artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, que consagra a dignidade da pessoa humana, reforça essa proteção, especialmente para indivíduos em situação de vulnerabilidade, como aqueles com Síndrome de Down.
Diversos julgados têm consolidado esse entendimento, a título de exemplo temos AgInt no AREsp nº 2.543.020/SP e no REsp nº 2.008.283/SP, ambos relatados pela Ministra Nancy Andrighi, onde o Superior Tribunal de Justiça determinou que a recusa de cobertura ou a limitação de sessões de terapias multidisciplinares, quando prescritas por profissionais de saúde, são abusivas e incompatíveis com o rol exemplificativo de procedimentos da ANS. Nesses julgados, o Superior Tribunal de Justiça reafirma que o rol de procedimentos da ANS deve ser interpretado de forma ampliativa, para abranger tratamentos essenciais ao bem-estar e ao desenvolvimento integral do paciente.
Essa decisão tem implicações práticas significativas. Ao assegurar cobertura ilimitada para terapias essenciais, o Superior Tribunal de Justiça permite que beneficiários com Síndrome de Down tenham acesso contínuo a tratamentos fundamentais para o desenvolvimento físico, cognitivo e social, como terapia ocupacional, fonoaudiologia e psicoterapia. Esses tratamentos, considerados indispensáveis por profissionais da área de saúde, são cruciais para a integração social e para o desenvolvimento das habilidades essenciais à vida dos portadores da Síndrome de Down, especialmente em sua fase de desenvolvimento inicial.
Assim, o entendimento adotado pelo STJ reafirma o caráter protetivo da legislação brasileira, garantindo o acesso pleno às terapias necessárias e rejeitando cláusulas que possam prejudicar os beneficiários, consolidando uma base jurisprudencial que orienta as operadoras de saúde a agirem em conformidade com os princípios da boa-fé e da dignidade da pessoa humana, proporcionando segurança jurídica aos beneficiários e suas famílias garantindo o acesso contínuo e irrestrito a terapias indispensáveis para uma vida digna e saudável.
Portanto, é indubitável que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça representa um avanço significativo na proteção dos direitos dos consumidores de planos de saúde, destacando o compromisso da Corte com os direitos fundamentais e a função social dos contratos no setor de saúde suplementar.