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22 de julho de 2024

Entra em vigor a Resolução SAA nº 55/2024: fim do conflito existente com a Resolução SMA 146/2017?

Por: Diego Rossaneis

No último dia 16 de julho, entrou em vigor a Resolução da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, de nº 55, que “dispõe sobre os procedimentos para análise de requerimentos sobre compensação da Reserva Legal em áreas adquiridas para esta finalidade sob a vigência do inciso III do artigo 3º da Res. SMA 146 de 08 de novembro de 2017”.

Antes de adentrarmos à problemática até então existente, vale tecermos breves comentários acerca do instituto da compensação de reserva legal, previsto no inciso III, do artigo 66, da Lei nº 12.651/2012, que instituiu o Novo Código Florestal.

O artigo 66 do Novo Código Florestal[1], prevê hipóteses de regularização da reserva legal para aqueles proprietários ou possuidores que detinham, em 22 de julho de 2008, áreas de reserva legal em extensão inferior àquela prevista no artigo 12[2], do mesmo códex.

Uma dessas possibilidades de regularização da reserva legal apontadas no artigo 66 é a compensação, inscrita em seu inciso III, que poderá ser feita em quatro modalidades, são elas: i) aquisição de Cota de Reserva Ambiental – CRA; ii) arrendamento de área sob regime de servidão ambiental ou Reserva Legal; iii) doação ao poder público de área localizada no interior de Unidade de Conservação de domínio público pendente de regularização fundiária e iv) cadastramento de outra área equivalente e excedente à Reserva Legal, em imóvel de mesma titularidade ou adquirida em imóvel de terceiro, com vegetação nativa estabelecida, em regeneração ou recomposição, desde que localizada no mesmo bioma[3].

Os requisitos obrigatórios para a compensação de reserva legal nas hipóteses citadas no parágrafo antecedente, estão previstos no §6º, do artigo 66, do Novo Código Florestal:

“§ 6º As áreas a serem utilizadas para compensação na forma do § 5º deverão:

I – ser equivalentes em extensão à área da Reserva Legal a ser compensada;

II – estar localizadas no mesmo bioma da área de Reserva Legal a ser compensada;

III – se fora do Estado, estar localizadas em áreas identificadas como prioritárias pela União ou pelos Estados.”

Após esse breve introito com a apresentação de uma das possibilidades de resolução do déficit de reserva legal, a compensação, focaremos no objeto central do conflito técnico-legislativo que a Resolução SAA nº 55/2024 buscou resolver: a compensação, nas hipóteses do §5º, devem ser feitas em áreas localizadas no mesmo bioma.

Pois bem, buscando definir os biomas existentes no Estado de São Paulo, a Secretaria de Estado do Meio Ambiente publicou, em 08/11/2017, a Resolução SMA nº 146, que instituiu o “Mapa de Biomas do Estado de São Paulo”, tendo, em linhas gerais, separado o Estado em três biomas: i) Mata Atlântica; ii) Cerrado e iii) Zona de Tensão, sendo essa definida como o “ecótono resultante do contato entre os fronteiriços Biomas Mata Atlântica e Cerrado”.

De acordo com a Resolução SMA nº 146/2017, ficou estabelecido que os imóveis situados no bioma Mata Atlântica, poderiam compensar seus déficits de reserva legal em outros imóveis situados também em Mata Atlântica e, também, situados em Zona de Tensão (artigo 3º, inciso I).

Já, os imóveis situados no Bioma Cerrado, apenas poderiam compensar seus déficits de reserva legal em outros imóveis também situados no Bioma Cerrado e, por último, os imóveis situados no bioma Zona de Tensão, poderiam compensar seus déficits em outros imóveis situados também em Zona de Tensão, bem como em Mata Atlântica (incisos II e III, do artigo 3º)[4].

Essa era a regra básica que deveria ser observada quanto à biomas e compensação de reserva legal, existindo ainda a possibilidade de compensação de áreas de Cerrado em Zona de Tensão e de Zonas de Tensão em Cerrado, desde que apresentado laudo de caracterização da vegetação, por profissional técnico capacitado com devido recolhimento de ART – Anotação de Responsabilidade Técnica, nos moldes dos parágrafos 1º e 2º, do artigo 3º, da Resolução SMA 146/2017[5].

Seguindo esses preceitos é que as compensações de reserva legal no Estado de São Paulo foram feitas até meados de 2022, onde, após a migração da base do CAR do Estado de São Paulo para a base Federal, ocorrida no final do ano de 2021, entrou em vigor a Resolução SAA nº 34/2022 que, pautada no artigo 5º do Decreto Estadual nº 65.182/2020, que instituiu o “Programa Agro Legal”, definiu que seria utilizado como base espacial vetorizada para análises do CAR, o MAPA Bioma IBGE 2004, que aponta para o Estado de São Paulo, a existência de apenas dois biomas, Mata Atlântica e Cerrado, abolindo assim a Zona de Tensão e redividindo o território paulista conforme essa regra.

Com a entrada em vigor do Decreto Estadual nº 65.182/2020, da Resolução SAA nº 34/2022 e a sistematização do MAPA Bioma IBGE 2004 como base vetorizada para análises dos cadastros ambientais rurais, abolindo o bioma Zona de Tensão, o artigo III, do artigo 3º, da Resolução SMA 146/2017 que estabelecia as regras de compensação de acordo com os três biomas paulistas (mata atlântica, cerrado e zona de tensão), perdeu seu efeito.

Dito isso, a pergunta que se fazia era: e as compensações de reserva legal feitas antes da entrada em vigor da Resolução SAA nº 34, que se deu em 29/03/2022, tendo como base os três biomas (cerrado, mata atlântica e zona de tensão)? Serão invalidadas?

Por óbvio, a grande discussão se deu em torno do bioma Zona de Tensão que deixou de existir, além da redistribuição dos biomas na área do Estado de São Paulo, agora entre mata atlântica e cerrado e, após um período de insegurança jurídica, finalmente foi publicada em 16 de julho de 2024, a Resolução SAA nº 55, que veio justamente para “garantir o direito para proprietários/possuidores rurais que adquiriram imóveis ou celebraram contratos para compensação da Reserva Legal, na vigência e sob os termos da Resolução SMA nº 146, de 08 de novembro de 2017”.

Assim, a Resolução SAA 55/2024, basicamente reestabeleceu a regra de compensação por bioma outrora contida no artigo 3º, da Resolução SMA nº 146/2017, para aquelas compensações feitas entre 08/11/2017 (entrada em vigor da SMA 146/2017) e 29/03/2022 (entrada em vigor da Resolução SAA nº 34/2022), estabelecendo compensações de mata atlântica em mata atlântica e zona de tensão, cerrado em cerrado e zona de tensão em zona de tensão e mata atlântica.

Mas para que isso seja possível, foram estabelecidos dois requisitos, que devem ser buscados mediante requerimento a ser feito através do “Sistema Fale CAR” (artigos 1º e 4º, da Resolução SAA nº 55/2024), esses contidos nos incisos I e II, do artigo 2º:

“Resolução SAA 55/2024 – Artigo 2º:

Para os imóveis rurais com passivo de Reserva Legal, localizados na Zona de Tensão, a que se refere o Anexo I da Resolução SMA nº 146, de 08 de novembro de 2017, a compensação da Reserva Legal de um imóvel em área de outro será aceita, desde que atendida uma das condições abaixo:

 I – a área onde se pretenda compensar a Reserva Legal deve ter sido adquirida até29 de março de 2022;

 II – ter sido celebrado e registrado em cartório, até 29 de março de 2022, contrato entre as partes para compensação da Reserva Legal.”

Dessa forma, atendidos os dois requisitos indicados nos incisos acima mencionados, será garantido ao proprietário e/ou possuidor, o direito à validade e reconhecimento da compensação de reserva legal, feita nos moldes de Resolução SMA nº 146/2017, que dividia o Estado de São em três biomas, mata atlântica, cerrado e zona de tensão.

Concluindo, a Resolução SAA nº 55/2024 é de enorme importância para os proprietários e/ou possuidores de imóveis rurais no Estado de São Paulo que haviam feito compensações de reserva legal utilizando-se como base a Resolução SMA nº 146/2017, garantindo à eles segurança jurídica e encerrando um período de limbo legislativo, pois, se atendidos os dois mencionados requisitos, elas serão validadas e aceitas, preservando o negócio e o investimento dispendido na aquisição de áreas para compensação de reserva legal.

[1] Art. 66. O proprietário ou possuidor de imóvel rural que detinha, em 22 de julho de 2008, área de Reserva Legal em extensão inferior ao estabelecido no art. 12, poderá regularizar sua situação, independentemente da adesão ao PRA, adotando as seguintes alternativas, isolada ou conjuntamente:
I – recompor a Reserva Legal;
II – permitir a regeneração natural da vegetação na área de Reserva Legal;
III – compensar a Reserva Legal.
[2] Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei:
I – localizado na Amazônia Legal:
a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas;
b) 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado;
c) 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;
II – localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento).
[3] § 5º A compensação de que trata o inciso III do caput deverá ser precedida pela inscrição da propriedade no CAR e poderá ser feita mediante:
I – aquisição de Cota de Reserva Ambiental – CRA;
II – arrendamento de área sob regime de servidão ambiental ou Reserva Legal;
III – doação ao poder público de área localizada no interior de Unidade de Conservação de domínio público pendente de regularização fundiária;
IV – cadastramento de outra área equivalente e excedente à Reserva Legal, em imóvel de mesma titularidade ou adquirida em imóvel de terceiro, com vegetação nativa estabelecida, em regeneração ou recomposição, desde que localizada no mesmo bioma.
[4] Artigo 3º – A compensação de Reserva Legal, que ocorrerá em área de extensão equivalente localizada no mesmo bioma, deverá observar:
I – Para imóveis situados no Bioma Mata Atlântica, segundo Anexo I, a área que receberá a Reserva Legal deve estar localizada no Bioma Mata Atlântica ou na Zona de Tensão;
II – Para imóveis situados no Bioma Cerrado, segundo Anexo I, a área que receberá a Reserva Legal deve estar localizada no Bioma Cerrado.
III – Para imóveis situados na Zona de Tensão, segundo Anexo I, a área que receberá a Reserva Legal deve estar localizada no Bioma Mata Atlântica ou na Zona de Tensão.
[5] §1º – No caso do inciso II, a área que receberá a Reserva Legal poderá estar localizada na Zona de Tensão, desde que o interessado apresente laudo de caracterização da vegetação elaborado por profissional habilitado, acompanhado da respectiva Anotação da Responsabilidade Técnica, demonstrando que a área possui vegetação própria do Bioma Cerrado.
2º – No caso do inciso III, a área que receberá a Reserva Legal poderá estar localizada no Bioma Cerrado, desde que o interessado apresente laudo de caracterização da vegetação, elaborado por profissional habilitado, acompanhado da respectiva Anotação de Responsabilidade Técnica, demonstrando que a área possuía originalmente fitofisionomia própria do Bioma Cerrado.