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5 de novembro de 2023

As Inconstitucionalidades Declaradas pelo STF a Respeito da Lei dos Motoristas Profissionais

Por Jader Solano Neme, Lara Sponchiado e Juliana Garcia de Tolvo Zamoner.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão virtual realizada no último dia 30 de junho de 2023, julgou inconstitucionais alguns artigos da Lei dos Caminhoneiros (Lei 13.103/2015), na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5322.O regramento tinha sido proposto para atender ambos os setores, empregados e empregadores, e, sobretudo, pensar a realidade desse setor econômico, cheio de nuances específicas.

Acerca da questão, o Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Alexandre Agra Belmonte, tão logo após a edição do Diploma 13.103/2015, teceu inúmeros elogios às novas disposições legais, afirmando que ela incentivava a negociação coletiva, propiciava a segurança do trabalhador e da própria coletividade, tanto ao exigir controles de jornada, como também ao obrigar o motorista a realizar exames toxicológicos e verificação de consumo de drogas e bebidas alcóolicas.

Acrescentou que a referida Lei fomentava tanto o Poder Público, como a iniciativa privada, a providenciar a melhoria da infraestrutura das estradas, entre outros benefícios. (2016, p. 41-42).

No entanto, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres (CNTTT) ingressou, em 2015, com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5322) no STF, questionando a constitucionalidade de diversos temas tratados pelo Código.

Henrique Correia (2023, p. 781) esclareceu que: “Segundo a entidade representativa da categoria dos trabalhadores, as alterações trazidas pela Lei n° 13.103/15 violam os valores sociais do trabalho (art. 1°, IV, CF/88), a liberdade de trabalho (art. 5°, CF/88), o princípio da irredutibilidade do salário (art. 7°, VI, CF/88), a saúde e segurança do trabalhador (art. 7°, XXII, CF/88) e a igualdade entre o trabalhador com vínculo empregatício e permanente e o trabalhador avulso (art. 7°, XXXIV, CF/88). Além disso, trazem prejuízos à segurança viária (art. 144, § 10, I, CF/88) e à ordem econômica e social fundadas, respectivamente, na valorização do trabalho humano (art. 170, CF/88) e no primado do trabalho (art. 193, CF/88).”

Nesse cenário, conforme ata de julgamento publicada no DJE em 12/07/2023:
O Tribunal conheceu parcialmente da ação direta e, nessa extensão, julgou parcialmente procedente o pedido, declarando inconstitucionais:

  1. por maioria, a expressão “sendo facultados o seu fracionamento e a coincidência com os períodos de parada obrigatória na condução do veículo estabelecida pela Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro, garantidos o mínimo de 8 (oito) horas ininterruptas no primeiro período e o gozo do remanescente dentro das 16 (dezesseis) horas seguintes ao fim do primeiro período”, prevista na parte final do § 3º do art. 235-C, vencido o Ministro Nunes Marques, que julgava inconstitucional a totalidade do § 3º;
  1. por maioria, a expressão “não sendo computadas como jornada de trabalho e nem como horas extraordinárias”, prevista na parte final do § 8º do art. 235-C, vencido o Ministro Nunes Marques, que julgava inconstitucional a totalidade do § 8º;
  1. por unanimidade, a expressão “e o tempo de espera”, disposta na parte final do § 1º do art. 235-C, por arrastamento;
  1. por unanimidade, o § 9º do art. 235-C da CLT, sem efeito repristinatório;
  1. por maioria, a expressão “as quais não serão consideradas como parte da jornada de trabalho, ficando garantido, porém, o gozo do descanso de 8 (oito) horas ininterruptas aludido no § 3º” do § 12 do art. 235-C, vencido o Ministro Nunes Marques, que julgava inconstitucional a totalidade do § 12;
  1. por maioria, a expressão “usufruído no retorno do motorista à base (matriz ou filial) ou ao seu domicílio, salvo se a empresa oferecer condições adequadas para o efetivo gozo do referido repouso”, constante do caput do art. 235-D, vencido o Ministro Nunes Marques, que julgava inconstitucional a totalidade do caput;
  1. por unanimidade, o § 1º do art. 235-D;
  1. por unanimidade, o § 2º do art. 235-D;
  1. por unanimidade, o § 5º do art. 235-D;
  1. por unanimidade, o inciso III do art. 235-E, todos da CLT, com a redação dada pelo art. 6º da Lei 13.103/2015; e
  1. por maioria, a expressão “que podem ser fracionadas, usufruídas no veículo e coincidir com os intervalos mencionados no § 1º, observadas no primeiro período 8 (oito) horas ininterruptas de descanso”, na forma como prevista no § 3º do art. 67-C do CTB, com redação dada pelo art. 7º da Lei 13.103/2015.”

Em outras palavras, o STF declarou inconstitucional temas em torno do “tempo de espera”, na medida em que considerou que os interregnos em que o motorista estiver esperando carregamento, descarregamento ou fiscalização do Poder Público, devem ser computados na jornada de trabalho, e, caso ultrapassada o limite de jornada, devem ser remuneradas como extraordinária, acrescidas de adicional de no mínimo 50% do salário-hora normal.

Também declarou a inconstitucionalidade da possibilidade de redução ou fracionamento dos intervalos interjornadas, bem como de postergação dos descansos semanais, impossibilitando, via de consequência, a cumulação de até 3 repousos semanais consecutivos em viagens de longa distância, aquelas cuja duração supera 7 dias.

Nessa mesma linha, também verbalizaram que o descanso do trabalhador não pode ser feito, em nenhuma hipótese, com o veículo em movimento, uma vez que a Lei nº 13.103/2015 consignou essa possibilidade quando o empregador inseria dois motoristas profissionais no mesmo automóvel.

Diante desse cenário, os direitos trabalhistas ligados à jornada, saúde e segurança do trabalhador tratados pela Lei n° 13.103 de 2015 foram declarados indisponíveis pelo STF, ou seja, que não admitem renúncia pelo motorista profissional, revogação por Lei infraconstitucional, ou negociação por norma coletiva.

Ocorre que, toda essa mudança tende a causar insegurança jurídica, oneração das folhas de pagamento, desincentivo no investimento de transportadoras, terceirização da atividade e, da mesma forma, elevação dos custos envolvidos nos produtos que serão transportados. Em síntese, a sociedade inteira vai arcar com o encaixe de situação anômala à legislação comum.

Assim, os esclarecimentos em relação às inconstitucionalidades declaradas pelo STF ainda tendem a ser tímidos, uma vez que, por ora, não foi publicado o acórdão da ADI n° 5322. Entretanto, desde já, é essencial orientação jurídica qualificada para se adequar às novas disposições legais em relação à jornada, saúde e segurança dos motoristas empregados, minimizando os impactos financeiros.

Fonte:
Belmonte, Alexandre Agra, novel Lei dos motoristas profissionais (nº 13.103/2015) e as questões jurídicas decorrentes. In: Revista do Tribunal Superior do Trabalho, v. 82, n. 1, p. 41-42, jan./mar. 2016.
CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRANSPORTES; https://cdn.cnt.org.br/diretorioVirtualPrd/63a3847d-b5ad-4f69-86dd-650dada3034f.pdf Acesso em 01.08.2023.
CORREIA, Henrique. Curso de direito do trabalho. 7. ed., rev., atual e ampl. – São Paulo: JusPodivm, 2023.
STF. https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4778925 Acesso em 01.08.2023.