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19 de setembro de 2024

Lei do Superendividamento: direitos, limitações e estratégias para recuperação financeira

Por: Carolina Milena

Aprovada no ano de 2021, a Lei 14.871 define como superendividamento a situação em que o consumidor de boa-fé assume sua impossibilidade de arcar com todas as dívidas que contraiu, sem comprometer o mínimo para sua sobrevivência.

De igual modo, a legislação também estabelece como dever dos fornecedores informar corretamente o consumidor sobre o custo, taxas, encargos e tudo o que pode influenciar para elevar o preço final do produto ou serviço ofertado, bem como atuar de forma ostensiva, assediando ou pressionando o consumidor para sua contratação, trazendo ainda em seu bojo importantes medidas para evitar e solucionar o problema do superendividamento, com sugestivas alterações que alcançam o Código de Defesa do consumidor e o Estatuto do Idoso, duas classes muito afetadas por esse tipo de problemas.

Por ocasião da aprovação da legislação em comento, foram inseridos no Código de Defesa do Consumidor os artigos 54-A até 54-D, cujo escopo é estabelecer as hipóteses de aplicação da legislação em comento, e, paralelamente prevenir a pessoa natural sobre a tomada de crédito responsável, e por fim, educando financeiramente e consumidor.

Traçando um breve paralelo entre os institutos, assim como as empresas detentoras de altos níveis de endividamento podem se valer da Lei de Recuperação e Falência para buscar a reestruturação de suas dívidas e manter a sua atividade empresarial, o consumidor, de igual modo, tem seu favor a Lei do Superendividamento, podendo, desde que cumpridos os requisitos estabelecidos pela legislação pertinente, reunir os credores em juízo ou fora dele para renegociar seus débitos, elaborando um plano de pagamento, recuperando, assim sua saúde financeira.

Podem se beneficiar da lei do superendividamento, o consumidor pessoa física de boa-fé que restar impossibilitado de pagar a totalidade de suas dívidas de consumo vencidas e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial.

No entanto, se faz de suma importância citar que não se aplica a legislação em comento ao consumidor que tenha contraído a dívida mediante fraude ou má-fé; que celebrado contrato sem intenção de cumpri-lo, ou ainda que tenha contratado ou adquirido produtos e serviços de alto valor.

De igual modo, não podem ser incluídas no plano de pagamento as dívidas sujeitas à garantia real (penhor, hipoteca), contrato de financiamento imobiliário ou de crédito rural e, qualquer outra dívida que não seja decorrente da relação de consumo, como por exemplos, as dívidas fiscais.

Aliás, de bom alvitre registrar que os Tribunais Pátrios vêm maciçamente, julgando improcedentes os pleitos autorais, decidindo, portanto, pela inaplicabilidade da legislação aqui tratada quando o autor, na tentativa de valer-se da lei, traz a juízo o anseio de compor-se, apresentando dívidas como, por exemplo, as oriundas de contrato de financiamento de veículos, em qualquer de suas modalidades, como, por exemplo, os contratos de alienação fiduciária ou os empréstimos para aquisição de referido bem móvel.

A esse respeito, trago à baila o Acórdão proferido no julgamento da apelação cível nº 1007071-86.2023.8.26.0048, publicado em 13.09.2024, ocasião em que a 26ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou provimento à apelação interposta pelo consumidor, mantendo, portanto, incólume a decisão de primeira instância, citando em suas razões de decidir que o instituto em questão é inaplicável vista a existência de dívidas com garantia, no caso, contrato de financiamento de veículo com sua alienação fiduciária.

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. Sentença de procedência. RECONVENÇÃO – Matérias apreciadas, na forma do art. 1.013, § 3º, III, do Código de Processo Civil – Contrato assinado digitalmente pela devedora. Abusividade de taxa de juros. Inocorrência. Juros previamente pactuados e lícitos, e não é excessivamente superior à média de mercado indicada pelo Banco Central, de cunho referencial. Notificação extrajudicial recebida por terceiro. Ausência de irregularidade. Notificação encaminhada ao endereço indicado no contrato, nos termos do art. 2º, § 2º, do Decreto-lei nº 911/69. Inadimplemento incontroverso. Adimplemento substancial do contrato. Inaplicabilidade deste instituto em casos de alienação fiduciária conforme entendimento firmado pelo STJ. Lei do Superendividamento não caracterizada na presente hipótese. Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO. (TJ-SP – Apelação Cível: 10070718620238260048 Atibaia, Relator: João Casali, Data de Julgamento: 13/09/2024, 26ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 13/09/2024)

Por fim, antes de se socorrer do Poder Judiciário visando a aplicação da Legislação aqui brevemente discorrida, é sempre bom adotar alguns hábitos com vistas a sair do endividamento.

Lance mão de algumas atitudes e use instrumentos simples, tais como uma folha de papel, lápis e uma calculadora.

A primeira e mais importante atitude é tomar consciência da situação de endividamento ou de superendividamento. Para tanto, você deve mapear e listar todas as suas dívidas.

Conhecer experiências bem-sucedidas e buscar ajuda profissional pode também ser um bom caminho. Listadas as dívidas, é hora de partir para a ação.